A evangelização ativa e passiva: quando tradicionalistas e progressistas se concordam

Algo em comum entre tradicionalistas e progressistas católicos é que parecem apresentar soluções para a Igreja apenas na mudança da forma interna da Igreja, uma forma passiva de mudar a Igreja. Enquanto tradicionalistas apostam na questão estética e litúrgica (ritos), os progressistas (teologia da libertação) apostam na mudança ou suavização da doutrina ou relativização total da mensagem evangélica. O que sempre manteve a Igreja e atraiu novos fiéis é a evangelização, usando um termo mais histórico e eclesial, a missão. Ao longo do tempo se usou outros termos, como hoje em dia, o Papa Francisco usa a expressão “Igreja em saída”. Esta é uma atitude ativa e não passiva como das duas correntes citadas.

É da natureza da Igreja Católica ser missionária, e não só levar o evangelho aos locais nunca evangelizados, mas também aos que perderam a espiritualidade cristã. Depois do Concílio de Trento, que marcou a contrarreforma, por iniciativa do clero a palavra missão voltou a circular, era necessário fazer o que Cristo tinha ordenado aos apóstolos e recristianizar a sociedade europeia que tinha andado em degradação. Eu uso o termo “ativo” para se referir a algo que realmente faz Igreja, sobre isso diz Daniel Rops: “É necessário, pois, usar meios mais ativos para voltar a lançar a semente evangélica. Em primeiro lugar, a Missão.”* Muitas vocações surgiram na época, instituições católicas de muitos tipos, a França ganhou uma expressão: “França país de missão” porque precisava ser recristianizada. Rops parece descrever uma situação parecida com a atual: “sobrevivem nela costumes, tradições e práticas religiosas”, mas a vida moral e espiritual está em grande degradação. Isso já é um recado claro aos que só pensam em tradição, mas não tem uma visão missionária da Igreja hoje.

Não encontro na história da Igreja fatos que mostrem que mudança litúrgica dentro do templo promova a atração de fiéis. O desenvolvimento litúrgico da missa tridentina no final da idade média se deu ao longo de muitos anos e havia suporte artístico e literário para essa missa tão desenvolvida, ou seja, para que correspondesse à altura da cultura da época, e assim falasse para a linguagem dos homens de tal época. Muito contrastante se comparado às diferentes liturgias que missionários adaptavam a missa à língua vernácula como no caso de Cirilo e Metódio na Europa Oriental. Claro que não vamos desconsiderar mudança das formas de orações que é objeto de polêmica, mas não tira o essencial.

Os tradicionalistas não querem apenas a liberdade de seu rito, mas têm esperança de que a liberação de todo rito antigo é a chave para o crescimento da Igreja. O mesmo para os progressistas, que querem mudar a Igreja por meio de medidas repentinas e burocráticas. A esperança deste grupo é tornar a doutrina adaptável à cultura moderna, mesmo que seja a cultura mundana ideologizada. Tornar uma doutrina perceptível por uma cultura local ou nação é tarefa do evangelizador ou pregador que sabe quais partes da doutrina e sacramentos devem ser apresentados em sua ordem e na melhor didática. Os teólogos justificam o progressismo e a maioria mal têm prática com evangelização, uma teorização que não parte da experiência pessoal como deve ser na filosofia, mas pega a discussão já formatada de teorias progressistas como a igualdade entre os gêneros. Os primeiros estágios da conversão não necessitam de discussão teológica ou doutrinal com o evangelizado, porque partem da aceitação de Jesus como pessoa.

Essas visões partem de uma estrutura de pensamento que nasce do intelectualismo que por pensar que se pode abarcar toda experiência pelo pensamento, concluem que é melhor planejar e construir tal grande instituição ou realidade. E no caso da Igreja, não procuram o que se deve viver o hoje que Deus tem a dar a ela e escutar o que Ele fala, o que seria se guiar por um desenvolvimento orgânico. Ratzinger** ao responder se o plano da igreja foi perdido responde: “Em uma época em que o modelo essencial de comportamento é o ‘poder fazer’, somos tentados a dizer: arregacemos as mangas e construamos a Igreja. Mas a Igreja não deve ser ‘feita’, deve ser vivida”. Muitas iniciativas de sucesso que são as Novas Comunidades e outros institutos são exemplos que têm crescido de forma natural e não como um planejamento ou imposição de como se acha que deveria ser. Pode facilmente observar que a renovação carismática não é um movimento com estratégia e finalidades próprias, mas uma corrente de oração animado por algo que não é deste mundo. Há um apego a um plano quando você pouco escuta a Deus e tenta valer mais os ideais de como deve ser, e geralmente escolhem ideais do passado que devem ser encaixados no presente a todo custo.

Portanto, os dois movimentos por serem presos a um intelectualismo e por não terem uma proximidade com o povo ou a vida real de uma paróquia ou comunidade estão preocupados mais em implantar o ideal do que ir em confronto a pessoas reais. Claro que dentro desses movimentos há pessoas que fazem trabalhos de formação e outros junto aos necessitados.

* Daniel-Rops, Henri, A Igreja dos tempos clássicos (I), Quadrante, 2000, p. 94.

** Ser Cristão na Era Neopagã, vol. III, Joseph Ratzinger, Ecclesiae, pag. 44-45.

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